domingo, setembro 28, 2008

Jardim das Borboletas


Jardim das Borboletas

Fui entrando, sonhador e decidido
Pelo portão dos sonhos, entrada do jardim.
Dispo-me de todo o tempo vivido
E sou apenas eu, o melhor de mim!

Passo a passo, sonho em sonho,
Me envolvo onde estou.
E nesta viagem só eu ponho,
O limite para onde vou.

Piso o verde fresco deste lugar,
Onde me chama o desejo.
Vogo pela brisa para buscar
O mais doce e eterno beijo.

Encontro num vale o rio,
Onde correm cor e beleza,
Nele mergulho e confio
Minha vontade e certeza.

Eu te acho no outro lado,
Destas águas cheias de vida,
Envolta num manto dourado
Em luz a tua pele vestida.

Caminho para ti vidrado,
Nesse olhar tão sem fim.
O teu sorriso perfumado,
O teu corpo de cetim.

Abraças o meu ser,
Até ao mais fundo da alma
E deixas-me adormecer,
Descansar na tua clama.

Deitados sobre o chão,
Cor de esperança e alegria,
Ferve em mim a paixão,
Ferve em mim esse dia!

Em que o céu foi mais azul,
O sol nasceu noutro lugar,
O vento, que sopra para sul,
Veio para nos fazer voar.

Sermos magia de criança,
Sonho belo de madrugada.
O infinito que se alcança
Para nós é a chegada.

Da viagem neste jardim,
Num caminho de nós.
Ainda vibra em mim
A melodia da tua suave voz.

E ao chegar o anoitecer,
Beijo a tua pele tão quente,
Suave aroma faz viver
Este fogo tão ardente…

Desvanecemo-nos depois,
Num bater de asas, sou feliz!
Tudo isto é de nós dois,
Borboletas, como sempre quis…


Estação do Céu
26.09.2008

( ξβ porque sim!!!)


sexta-feira, setembro 12, 2008

Fogo de Artifício


Fogo de Artifício

Um rastilho ateou a noite e o esquecimento,
No silêncio do breu algo despertou um olhar.
Tudo explodiu e a aurora fez sucumbir o negro,
A virtude e o defeito em roda-viva, flamejando o céu.

Ascendiam como velozes aves rasgando o firmamento,
Queimavam tudo o que eu fui e sou bem cá dentro.
A quimera que nasceu é a solidão que morre,
Quando chegam ao topo do mundo e tudo é luz.

A manhã já é fogo e a tarde um sol incandescente,
Cheio desse calor que eu tanto abraço e abraço,
E que anseio cada dia que passa, cada hora que bate
No relógio do meu peito, segundo após minuto…

Abro as assas nesse breve voo e descanso
No teu colo, que pinto com as cores desse sonhar
E que explode em mim a cada palavra que escrevo,
A cada beijo que bebo no teu terno e suave sorriso.

Trovejam em mim os instantes em que a noite é o dia
E entram em mim os restantes em que dia é noite e me perco.
Vagueio numa doença chamada paixão e desmaio
Nos teus braços a vida nas tuas mãos um caminho!

Curas esquecidas, passados levados, fantasmas punidos,
Para dimensões apropriadas aos seus vícios e devaneios.
Só quero o eterno sol nascente e o orvalho da manhã
Em ti perdido sem pontes sobre os nossos rios…

Subir ao céu num instante mágico e sem mais donos,
O meu existir guardado em ti em vivas recordações.
Todos os passos ligados num infinito universo de cor,
Nossos dedos amarrados à esperança desmedida.

Só nossos corpos explodem nesta paleta,
Só o negro da minha noite se apaga num clarão.
No teu pescoço eu tenho o meu sorriso,
Na tua alma a minha vive…



12.09.2008
Bandalhoeira


Para a Borboleta mais mágica e fascinante, que explode em sorrisos e em cores no negro da minha noite

quinta-feira, junho 12, 2008

Tempo


Tempo

Deitado na areia espessa e fria,
Crucificado pelo manto que cobre o céu…
Tanta coisa frui em mim,
Tanta coisa gira a volta deste lugar.
Passando pelos retalhos que o tempo fez no véu
Chegam-me os brilhos e os fogos de outros mundos,
Que alguém deixou para lá do negro da noite…

Todo o meu corpo se entrega ao infinito,
Braços abertos esperando o desconhecido,
Olhos cerrados olhando o mar
E o cheiro do sal e o marulhar da rebentação entram em mim.
Só quero ser parte do areal,
Só quero ser parte do amor entre terra e mar.

Concebo o mundo num todo
E sofro com a minha insignificância exterior,
Enquanto eles saltam e rebolam na areia,
Falando alto sobre coisas sem sentido.
Eu não sou assim…

Eu só quero ser o vento
E ficar ali olhando, escutando, amando.
Eu só quero ser o tempo
E com isso ser e ter tudo.
Parar o dia em que se chora,
Parar a noite em que me falta uma parte da alma,
Parar o mundo que se suicida todos os dias,
Parar a existência e reinventar
Cores, sabores, sensações.
Reescrever o que me foi deixado e ainda ecoa da criação original.
Recriar o verde que um dia foi esperança
E agora não passa de uma cor e de uma palavra em tudo dissociadas.

E vejo a trovoada que urge no negro horizonte azul,
Sinto que o tempo muda mas o existir não.
Pinto o meu corpo em contornos fortes naquela praia,
Para que fique para sempre ali a minha vontade,
A minha força de amar loucamente e tudo o que há num “eu”.
Deixo lá todas as cores que circulam em mim,
Que bombeiam e ilustram o meu coração.
Enterro os tesouros que conheço e mapas para tantos outros,
Planto as sementes da minha vida e dos caminhos para a eternidade,
Lanço ao mar em garrafas mensagens para mundos e lugares distantes,
Segredo ao vento, para que suba ao céu e passe pela noite até ao universo,
Tudo o que sempre guardei e nunca ninguém descobriu.

Espero um pouco mais pela trovoada,
Mas ela ainda demora.
Os clarões ao longe são só o anúncio,
Tal como o que escrevo anuncia o que serei.
Porque hoje ainda não sou o tempo, nem o vento, nem o infinito, nem a eternidade,
Mas os meus passos são para essa escada de degraus de ouro,
Onde cada movimento é a unidade de tempo
E onde homens e deuses se regem pelo mesmo e único ponteiro.
Parto de costas voltadas ao ontem
E deixo ali naquele lugar o amanhã,
Para que o mar o engula e leve para outros paraísos que banhe.
Porque qualquer lugar é eterno e mágico,
Qualquer lugar é inferno e sofrimento,
Mas quem vive para o eterno é mago e alquimista,
Que transforma pedras em ouro,
Dor em luz, sangue em vida…

Ali fica a minha cruz,
Ali fico eu,
À beira do mar que sonho eternamente,
À beira do mundo e da sua gente,
Amor diferente, amor ardente,
Barco alado com viagem para o princípio do fim…


(Ericeira)
Caparica
3.06.2008

quinta-feira, maio 22, 2008

Espelhos


Espelhos

Atravesso a rua calmamente
E olho perdido as montras.
Diluído no ondular da gente,
Porque não me encontras?

Caminho alegre na minha tristeza
E deixo que a chuva seja o que falta de luz.
Absorvo cada sorriso e a sua beleza,
Deixo-me levar pela corrente que conduz…

Oscilo, observo e então prossigo,
Porque cada corpo tem um destino,
Como páginas de um livro antigo,
Onde me lembro de ser menino…

Trago o esquecido para tão perto
E choro o sofrido para longe de mim.
Deixa estar o livro bem aberto
E deixa folhas para contar o fim…

A chuva cai incessante
E as lágrimas fazem rio,
A tua falta é constante,
A tua ausência é o frio.

Olho-me nos mares de água
Observo-me, sinto-me a mudar.
Estou aqui à beira mágoa
E és tu quem estou a contemplar!

Procurei-te por toda a rua,
Nos cafés e nas esplanadas.
Esperei que chegasse a lua,
Esperei as luzes serem apagadas…

Sem medo e sem receio,
Seguro do que a noite traria.
É de ti que estou cheio,
És tu quem faz a noite dia.

Porque há fogo dentro de nós
E lenha dentro de cada ser,
E enquanto não formos sós
Há chama para nos acender.

Há o corpo fervente,
Há inspiração e sonho,
Há a palavra eloquente
E os versos onde a ponho.

Há um eterno elo de ouro,
Entre os do céu e os da terra.
Há pobreza no maior tesouro,
Há paz numa qualquer guerra.

Sente o sorriso dessa criança,
Que abraça a mãe ao teu lado.
Sente a felicidade que alcança
No infinito sabor do seu gelado.

Coisas tão insignificantes,
Para um mundo que não tem lugar.
Enquanto nós geramos diletantes,
Um dia com destruir outro com criar.

Até que alguém há-de acordar
E descer a mesma rua triste.
Navegar nos outros, navegar
E encontrar a verdade que existe…



Lisboa
22.05.2008


(à Joaninha, por me ter feito encontrar um dos meus espelhos que anda diluído no meio das gentes e perdido nas ruas...beijo)

quarta-feira, maio 21, 2008

Cores


Cores

Reaprendo as cores do mundo,
Em todas as suas tonalidades.
Mergulho azul no mar profundo,
Esqueço negro as futilidades.

Sangue fervente de vermelho,
Amarelo mágico de fim do dia.
Cara e corpo a mudar ao espelho,
Peço tudo o que queria…

Venha o medo e a incerteza,
O roxo do pecado e da dor.
O verde esperança e beleza
E todas as cores donas do amor.

Têm todas vida em mim,
Em qualquer ordem e lugar.
Tenho o princípio, quero o fim.
Só sonho o verbo chegar!

Quero o dourado de um rei,
Para dar à mais pura das rainhas.
Quero o céu e tudo o que sempre sonhei,
Que todas as cores sejam tuas e minhas!



Bandalhoeira
17.05.2008

(à minha "amiga colorida" que me traz todos os dias o amarelo do fim do dia, com um grande beijo azul)

segunda-feira, maio 19, 2008

Na Noite Escura


Na Noite Escura


Na noite escura
Você procura
Alguém que você amou…
E a vida dura,
Segura
Quem você não agarrou…

E você procura
No meio loucura
E não encontra ninguém.

Busca então a fé,
Que é
Razão para viver,
E você quer regressar
E amar
Quem o faz renascer.

E você procura
No meio loucura
E não encontra ninguém.

E aí regressa,
E achando que é dessa
Você procura melhor.
E o seu amor
Voltou,
Só p’ra você.

E você procura
E no meio loucura
Afinal encontra alguém…

Que ama você…

19.05.2008




À Mariana, grande apaixonada por esta letra, que deixo com a data especial de hoje =)


Beijos e Parabéns





Diário de Bordo


Diário de Bordo

Olho as horas demoradas,
Pouco falta para o meio-dia.
Vejo as semanas passadas
E repenso quem seria…

As decisões de um Passado
E as escolhas do Futuro,
Deixam algo marcado,
Tiram algo seguro.

São um quarto para o fim,
Da vida que pode ser tão breve.
Procuro redefinir para mim,
Este fardo nada leve.

Carregando às costas o tempo
E no peito a saudade,
Eu penso no movimento
Da perpétua verdade.

Tenho um caminho a escolher,
Um universo de opções.
Tantos textos para escrever
E um infinito de sensações.

Embarco na viagem
Para um desconhecido desejado,
Estamos todos aqui de passagem
E todos com um legado.

Debaixo da almofada
Guardo sonhos e o diário de bordo,
Uma vida recordada,
Por palavras em que acordo.

Todas as manhãs,
Todas as noites também,
Eu vejo almas vãs
E corpos sem ninguém.

Mergulho no oceano
E morro sem ar.
Vida no branco pano
Das velas, que hei-de rasgar…

Hoje mudo a direcção,
Viro o leme para o céu,
Tenho a minha ressurreição,
Ergo-me do meu mausoléu.

Vamos para o sempre renovado,
Eu e quem me saiba amar.
Tempo e espaço apagado,
Só mar para navegar!

Não há uma só corrente
Que me possa prender.
O peito é ardente
Ao ponto das ondas fender.

Então rompo as vagas,
Rasgo o peito para viver,
Tudo o que tu tragas,
Tudo o que em mim queiras ser…


Caparica
15.05.2008

Assassino da Monotonia


Assassino da Monotonia

Penso constantemente em verbos que se desvanecem,
Em viver, amar, sentir e em tudo o que dai se deriva.
Penso constantemente e não vejo porque se esquecem
E se apagam da existência, só por si já tão esquiva.

Ensino e procuro apreender as minhas matemáticas,
Interrogando os olhos de quem não me ouve nem vê.
Tentando encontrar razões e justificações práticas,
Provavelmente nada mais do que um porquê…

Sou julgado, assassino da monotonia,
Homicida da plenitude e ignorância.
Aquele que desmascara a hipocrisia,
Aquele que rouba o dinheiro à ganância.

Tenho esperanças de outros futuros,
De outros verbos, pessoas e conjugações,
Espíritos que saltem novos muros,
Almas onde se possam escrever novas lições.

Algoritmos de verdades absolutas,
São chão estéril e de pouco alimento.
E essas mentiras que amas e escutas,
São falso alívio para o puro sofrimento.

Não há uma regra que possa reger o ser,
Não há um lugar e um céu perfeito para alcançar.
Só há o presente para que o faças crescer,
E uma morte que deixe a voz eterna para te cantar…



Caparica
06.05.2008

sexta-feira, abril 25, 2008


Perdas, Decepções, Traições e Outras Vitórias

Perdas, decepções, traições e outras vitórias,
Mil duras situações mil e uma outra histórias,
De tempos e momentos para esquecer,
Dias cinzentos, o céu a chover.

Negro, escuro, noite, segredos do breu,
Caminhos pouco seguros, no universo que sou eu…
Andando deambulante, vida perdida na hora
Morte constante, sangue a correr corpo fora.

Espeta o punhal fortemente no eu lírico,
Morrer como animal, sentimento empírico.
De joelhos sobre o chão em que não morri,
A morrer sem justificação pelo mal que não cometi…

Mas o morrer de hoje é o nascer amanhã,
Às vezes a lógica foge e faz a razão coisa vã.
Distante de semânticas e significados mesquinhos,
Renasço em forças quânticas de universos vizinhos.

Com a energia de um sol que há muito explodiu,
Preenchido pelo fole do ar que alguém expeliu.
Sopro de vida significado para o ser,
Porta de saída que do céu veio descer…

Abre-se para o mundo do futuro mudado,
Em apenas um segundo o sofrer é levado.
Não há rimas possíveis entre bons verbos e más pessoas,
As coisas plausíveis são sensações em tudo boas.

Já perdi e ganhei, fui afastado da verdade,
Traído, nunca paguei com a mesma liberdade.
Podia não ser eu, mas não era assim ninguém,
Porque eu vivo do céu e do que está mais além…

E vou vencendo, aquele que me quer derrubar,
E vou vendo, o que o mundo tem para me dar.
Acabo por não comprar o que tenho para oferecer.
Espero só alguém que queira amar, dar e receber.

E continuo a viver, amar e a sentir,
A chegar e a querer, a lutar e a partir.
E eu eterno ressuscito e eu uno me faço,
O peito solta o grito e o corpo dá o passo!

Na direcção do índigo, céu azul misterioso,
Parto migrante para o sul esperançoso,
De ter a única, divina e absoluta verdade
E algum dia numa esquina eu cruzarei a eternidade...


Caparica
23.04.2008

terça-feira, abril 22, 2008

Menina do Mar


Menina do Mar

Nos teus olhos sinto a alma de um mar,
No teu cabelo o sol que se espraia, raiando areal fora.
Minha virtude tem sido esperar,
Que haja mundo e haja hora!

Quero ter em mim a força da rebentação,
Das fortes ondas que agitam a praia serena.
Ter o céu e o infinito na minha mão,
Para fazer da distância coisa pequena.

Procuro-te do outro lado do risco eterno,
Que separa os homens de deus.
Quero ver nascer pontes de carinho terno,
Entre os meus olhos e os teus.

Quero sentir esse teu perfume,
De mil brisas e ventos soprados.
Ver acender-se e crescer em ti o lume,
Deliciando meu espírito em teus reflexos dourados.

Quero pintar-te o infinito e tudo mais além,
Dar-te o que só ao mar diz respeito,
Roubado docemente ao ondular que vai e vem
E levado por mim a velejar até ao teu peito.

Não sei quem és nem de onde vieste,
Voz do azul, companhia divina.
Só sei que estas palavras foram o que quiseste
E são só tuas, meu mar, minha menina…


Praias de S.João da Caparica
16.04.2008
(Para a Diana...com o sol e o mar ...)

Quero(te)


Quero(te)


Queria ver unidas música e palavras,
Nas doces linhas de um corpo leve,
Mas os campos de trigo que lavras
São no meu mundo alimento breve.

Falta-me o sol quente e a chuva fria,
O cheiro da terra molhada ao amanhecer…
Tenho o desejo de saber o que o céu seria
Se nascesse depois do trigo morrer.

Eu quero a noite e a bruma,
Quero o dia e a luz,
Quero o mar e toda a sua espuma,
Quero a praia e o vento que me seduz!

Balanço e oscilo livremente,
Sobre mundos e sobre gentes.
Quero equilíbrio permanente,
Quero loucuras de corpos e mentes…

Quero morrer e viver,
Viver e morrer eternamente!
Quero saber e não saber,
Saber e ignorância em equivalente.

Quero ser forte e não ter força alguma,
Para sempre, fortemente preso à liberdade…
Quero o universo e coisa nenhuma,
Ser virtude e a nulidade.

Não quero ser mais do que eu,
Não mais do que tudo e nada…
Quero o infinito escondido no céu,
Quero o Horizonte porta de chegada.

Quero um toque de maldade
E outro de altruísmo e entrega.
Quero ser acusado de bondade,
Quando a sua falta se alega.

Quero ser teu e meu simultaneamente.
Estar sozinho e com o mundo num só.
Quero o nunca e o constantemente,
Quero ser lembrado e morrer como pó…


Caparica
04.2008

terça-feira, abril 01, 2008

Curas de Sangue


Curas de Sangue

Hoje sou a tua sombra deambulante,
O teu reflexo no fumo que se desvanece.
Hoje sou o relógio de corda inconstante,
Que chora o tempo de que se esquece.

Sou o teu sangue latejante,
Num rio de raiva crescente,
Onde as vagas de luz flamejante
Levam e afogam toda a gente!

Rasga as muralhas do teu olhar,
Chama-me do mundo do índigo.
Venho nas asas do verbo Sonhar,
Venho eterno, venho ser teu Abrigo!

Preencher as feridas nos teus braços,
Arrasar a dor do teu corpo leve.
Fazer-me vivo no vazio de cada espaço,
Matar os cavaleiros da vida breve…

Solidão, medo, dor e morte.
Nuvens negras, céus do inferno,
Abismos da escura sorte,
Que trespassam o corpo mais terno.

Deita-te e descansa em mim,
Sou teu barco para outro firmamento,
As asas que te roubam ao derradeiro fim,
A nova vida, o novo nascimento…

Monte Caparica
01.04.2008

quinta-feira, março 13, 2008

Devaneios por Extenso


Devaneios por Extenso

O que é linear numa imagem?
O que se olha e não se vê?
Até quando estaremos de passagem,
A viver sem um porquê?

Quando escreveremos o mundo com gestos,
Com sons, palavras e afectos?
Quando lançaremos nós actos manifestos
De sentimentos e ideais rectos?

Quando seremos dois num só
E tudo no nada?
Quando ergueremos do pó
Vida eterna, vida amada?

Quando falarei e serei ouvido
Por mares de corpos apaixonados?
Quando amarei e serei sentido
Por teus olhos iluminados?

Quando, quando, quando…?
Como, onde, porquê?
Não sei mas vou amando
O que vejo, o que se sente e não se vê

Até lá, deixo o que penso,
Um livro, letras, ideias, um eu…
Breves devaneios por extenso
De alguém que Morrerá, Cresce, Nasceu…


Lisboa
28-02.2008

sexta-feira, março 07, 2008

Sumir



Sumir

Hoje sou um barco afogado no oceano,
A folha que morre no vento sem rumo.
Sou todo eu o findo cair do pano,
O fim de um cigarro, cinzas de fumo.

Sou o efémero grito de morte.
Sou um princípio sem fim.
Sou as cores de negro forte,
Da noite que cresce em mim…

Escorre o tempo no meu leito,
Morre a solidão de um dia vago.
Falta-me o ar e o fogo no peito,
Falta-me a luz que agora apago.

Acordo neste templo profano,
Onde o céu cedeu por inteiro.
Movem-se corpos ao som de um piano,
Bailando perdidos pelo nevoeiro.

Há lágrimas num copo de infinito,
Que escorrem de mim sem as chorar.
Há sangue num coração que bate aflito,
Salta na alma, salta no corpo sem parar…

Morre, vive, morre, pára,
E tudo o que despertou adormece.
Na vida que é fraca, breve, rara
E no espírito que se enfraquece…

Bandalhoeira
07.03.2008

domingo, fevereiro 24, 2008

Eclipse



Eclipse


Hoje somos um só a ver estrelas e a sonhar o horizonte.
Enquanto a noite corre todas as janelas sem entrar,
Passa pela minha e leva-me até onde quer que tu estejas,
Com a tua luz a ofuscar a ténue existência dos seres nocturnos,
E com todo o teu brilho a convocar um eterno sonho em teu redor.
Absorve-me nesse teu calor e perfume!

Faz vibrar em mim cada pedaço vivo de imaginação e de utopia!
Deixa-me deitar a cabeça no teu colo e olhemos pela varanda,
Esquecendo que lá em baixo as ruas dormem do frenesim habitual,
Que os candeeiros marcam tristemente lugar nas calçadas despidas
E que os poucos homens que as percorrem levam os bolsos vazios.
Olhemos antes o que está para além,
Enquanto a fugaz frincha de lua faz brilhar este mundo.
Olhemos para ver que somos um e que esta noite tudo se completa.
Que o barco parte e navega o infinito,

Que o pássaro abre as asas e voa o eterno,
Que os nossos corpos se juntam na distância,
Que os nossos passos se movem na escuridão.
E quando não houver nem a lua, brilharás tu
Dentro de mim transbordando pelo céu,
Até que se encha de inveja a senhora da noite e chorem as estrelas do firmamento,
Até que o pulsar único deste breve momento preencha toda a alma,
Até que o olhar irradie a tua vida, a tua essência, esse meu deslumbramento.
Não restarão palavras, só toque, entrega, chegada...
E quando o pano descer e se calarem os aplausos,
A minha cabeça continuará no teu colo e o meu coração deitado sobre o teu.
Eu terei o mundo...
E a minha noite escrever-se-á com as palavras em que nos deitámos.

Bandalhoeira

24.02.2008

terça-feira, fevereiro 05, 2008

Fascínio de Mudança


Fascínio de Mudança

A noite não é a luz que falta,
Nem os escuro que cresce.
Não é o coração, a pulsar que salta,
Nem um corpo que se mexe.

Fazem-se conclaves,
De gentes desconhecidas
Para erguer pelas claves
Partituras, escritos e outras vidas...

Arrastam-se em frenesim,
Aqueles cujo interior colapsa.
Noite após noite festim,
Que passa, passa, passa...

Donde vieste?
Para onde voltas?
Que amor trouxeste?
Que segredos escoltas?

Que guarda armada é a tua,
Que me deixa sem mim?
Que intriga as pedras na rua,
Passos e passos sem fim...

Fascinante certeza
Do sorriso a deambular.
Terrível bela natureza
Que me deixou a pensar...

Mudar assim um universo
Só com sorrisos e fitar de olhos.
Se não há sonho, não há verso,
Há um barco preso nos escolhos...

Ah mas eram olhos vivos!
Eram olhos de um tudo infinito.
Lábios esquivos
Beijando o que foi escrito.

Apagando ponto a ponto,
Letra a letra, sem parar,
O que tem sido o encontro
De uma vida sem pensar...

Escrever a alma
Sem ter lido a paz e a guerra,
É não saber o que diz essa palma
Nem os segredos que encerra.

Quem me dera mais uma hora...
E outra e outra depois dessas.
Andar por cenas e actos fora
A ver o mundo representar as suas peças.

E tu que partiste o inquebrável,
E reescreveste os papiros de um passado,
Levas o sorriso inesgotável
E deixas-me um todo uno e saciado...

05.02.2008
Bandalhoeira


Para ti doce desconhecida...

terça-feira, janeiro 22, 2008

Os Anjos da Minha Rua


Os Anjos da Minha Rua

Os anjos da minha rua são os pombos.
Lágrimas que Deus chorou dum dia plúmbeo e triste
E que se despedaçaram, num bater de asas, sobre os telhados e águas furtadas.
Passaram à porta da loja de música fazendo soar os gongos
E abanaram tudo o que fora e dentro de mim existe,
Deixando as lágrimas correndo em minhas mãos molhadas.

E é da janela do terceiro andar que vejo o tempo,
Vejo-o passar pelo espaço dando nós
E olho a norte o que vem e a sul o que vai,
Apagando-se as pegadas na praia de calçadas, que piso a cada momento
Ouvindo gente que fala e não tem voz
E que entra em mim e logo sai…

A cada dia vejo mil caras e nenhuma é igual.
Num circulo de linhas rectas que se curvam para dar forma
A um sem lugar de lugares comuns e de caminhos,
De factos vindos do desléxico sobrenatural
Que troca as letras de coisas dentro da norma,
Para formar as complexas malhas dos ninhos.

Onde se deitam lágrimas aladas,
Com frases que só Deus diz aos anjos chorados.
Poesia de eternidade e de amor dedicado,
Ao passar de ondas por almas lavadas
Que invadem corpos deitados,
Em movimento ondulatório quente e delicado…

Batem as asas nas telhas do sótão
E do meu dormir cansado eu os vejo abraçados,
Na ternura de um calor que nasce nesta tarde de Inverno.
E enquanto o sangue vai e vem do coração,
Os laços estão sólidos e apertados
E tudo se mistura e tudo se transforma e tudo é eterno.

Deus falou e eu ouvi…
Levantei-me e caminhando percorri o futuro.
Vi-me no espelho tão diferente e mudado, mas mesmo assim tão eu.
Recordo tudo o que fui, tive e senti
E nada, do meio do escuro,
Pode trazer o que se perdeu…




Lisboa (Rua dos Anjos)
15-11-2007